terça-feira, 5 de outubro de 2010

Monangambé do MPLA

Aquela roça grande
continua a não ter chuva
é o suor de outros rostos
que rega as plantações;

Aquela roça grande
ainda tem café maduro
e aquele vermelho-cereja
são gotas de outro sangue
feitas seiva.

O café vai ser torrado,
pisado, torturado,
continua a ser negro,
negro da cor do contratado.

Negro da cor do contratado!

Perguntem às aves que já não cantam,
aos regatos de alegre serpentear
e ao vento forte do sertão:
Quem se levanta cedo?
Quem vai à tonga?
Quem traz pela estrada longa
a tipóia ou o cacho de dendém?

Quem capina e em paga recebe desdém
fuba podre, peixe podre,
panos ruins, cinquenta kwanzas
"porrada se refilares"?

Quem?
Quem faz o milho crescer
e os laranjais florescer?

- Quem?
Quem dá dinheiro para o patrão comprar
máquinas, carros, senhoras
e cabeças de outros pretos
para os motores?

Quem faz o MPLA prosperar,
ter barriga grande
- ter dinheiro?

- Quem?

E as aves que cantam,
os regatos de alegre serpentear
e o vento forte do sertão
responderão:

- "Monangambééé..."

Ah! Deixem-me ao menos subir às palmeiras
Deixem-me beber maruvo
e esquecer diluído
nas minhas bebedeiras.

Nota: Poema original de António Jacinto. Monangambé (O contratado) eram angolanos negros contratados para trabalhar nas roças dos brancos, na era colonial. Hoje são angolanos negros contratados para trabalhar nas roças dos negros donos do poder.