quarta-feira, 20 de maio de 2009

«Capitão, quando é que a liberdade vai embora?» - Um livro de Afonso Cabral

«Tempo flutuante – da golpada de Cabinda ao saque de Dalatando» de Afonso Eça de Queiroz Cabral é o testemunho frio e mordaz, contado através de episódios soltos, indiferentes ao politicamente correcto, dos últimos dois anos da presença portuguesa em Angola.

Não tem qualquer pretensão de ser um livro de história sobre a Guerra Colonial. Desprovido de qualquer análise estratégico militar, ou de ponderações ideológicas, o pequeno livro «Tempo flutuante – da golpada de Cabinda ao saque de Dalatando» é um monólogo de episódios vividos com as tripas do capitão miliciano Afonso Cabral, registados 30 anos depois dos acontecimentos.

Frio e cáustico, Afonso Cabral não perde tempo com floreados literários. Imprime sem rodeios a sua personalidade e transporta o leitor para a experiencia vivida num dos momentos mais caóticos da guerra em Angola. Embebido por um sentido absoluto de cumprimento da missão Afonso Cabral consegue na primeira pessoa provocar uma antipatia por si mesmo, reflectindo todavia a atitude de um militar em combate que teve soltos lapsos de emoção.

Em 132 páginas Afonso Cabral conta apenas aquilo que viveu e ruminou. Sem entrar em divagações políticas e históricas vai pintado retratos dos actores e do caos que Angola viveu nas vésperas da independência.

«Nem pensar! Eu fazer uma operação com o MPLA? Isso é contra tudo o que eu sou» reagiu Afonso Cabral quando o informaram em Cabinda que tinha de fazer uma operação conjunta com o MPLA contra a FLEC, quando o enclave vivia um clima insurreccional perante o desespero do Brigadeiro Themudo Barata «que estava altamente comprometido com a FLEC» enquanto as tropas portuguesas estavam «altamente comprometidas» com o MPLA.

Através de episódios soltos relata o saque selvagem de Dalatando e a chegada de um comité do MFA vindo de Luanda, para uma reunião com os oficiais, mais embebido em discursos revolucionários que em definir uma estratégia para minimizar o caos estabelecido. «E o marinheiro de águas turvas rematou o seu papaguear panfletário: “E agora quem não estiver de acordo com o programa do governo levante-se e abandone a sala”» conta Afonso Cabral aludindo à incompatibilidade da febre revolucionária de 74 com sua postura de puro militar.

«Capitão, quando é que a liberdade vai embora?» perguntou um angolano a Afonso Cabral cansado do mergulhar caótico de Angola na espiral de uma guerra civil previsível.

Os relatos de Afonso Cabral terminam com a partida definitiva de Luanda, depois do Niassa ter zarpado. «Não estávamos a partir. Estávamos a ser empurrados, estávamos a ser expulsos, estávamos a fugir.»

Afonso Cabral nasceu no Porto em 9 de Maio de 1947. Cumpriu o serviço militar de Outubro de 1972 a Outubro de 1975.

«Tempo flutuante – da golpada de Cabinda ao saque de Dalatando»
Afonso Eça de Queiroz Cabral
Prefácio de Jaime Nogueira Pinto
Edição Diel, 2009

Fonte: http://www.ibinda.com/

1 comentário:

Anónimo disse...

Esse Afonso Cabral mostrou em Dalatando que é um poltrão!
Cap. Jeremias (Unita)